Improbidade administrativa, licitações e diálogo competitivo: qual a relação?

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Improbidade administrativa, licitações e diálogo competitivo

Um dos grandes receios de qualquer empresa participante de processos de licitação é ser condenada por crime de improbidade administrativa, o que poderia gerar sanções de ordem financeira, administrativa, criminal (para seus gestores) e até mesmo a impossibilidade de licitar com a Administração Pública por determinado intervalo de tempo.

Em muitos cenários, as onerosas sanções pecuniárias e mesmo o impedimento temporário da participação em certames licitatórios, decorrentes das condenações por cometimento de ato ímprobo, podem contribuir para o encerramento de empresas.

Para o gestor público também recai o quase paralisante receio em incorrer em qualquer conduta violadora às abrangentes normas que regem os procedimentos licitatórios, em especial, ante a acirrada fiscalização exercida pelos órgãos controladores, tais como o Tribunal de Contas e o Ministério Público.

Dentre as possíveis irregularidades em uma licitação, pode-se mencionar a participação de empresas licitantes na fase preparatória de um processo licitatório.

No regime da Lei de Licitação nº 8666/93, vigora o regramento segundo o qual é vedado ao autor do projeto básico ou executivo de uma licitação participar/concorrer neste mesmo certame licitatório, à exceção de contratações em que o projeto executivo fique à cargo do contratado. E assim o é como forma de se evitar o direcionamento do objeto licitado para a participação restrita de uma ou outra empresa licitante.

Trata-se, contudo, de limitação legislativa que claramente impede a necessária interlocução entre entes públicos e licitantes interessados em aperfeiçoar as soluções propostas para atendimento das demandas públicas e as condições técnicas de execução do objeto licitado, sobretudo, quando envolva contratações de inovação e/ou de maior complexidade, para os quais o Poder Público não detém prévia expertise.

Na prática, esse rígido formato normativo produz, como efeito, editais pouco eficientes, desprovidos de rigor técnico e até mesmo com notáveis falhas técnicas quanto ao projeto e à própria precificação referencial, em desacordo com a prática de mercado, fatores tais que, conjugados, contribuem para afastar muitas empresas do ato concorrencial.

Já na fase de execução contratual, muitas vezes, faz-se necessária a correção de vícios de projeto, por meio de aditivos contratuais, que deixam as empresas contratantes vulneráveis aos órgãos de controle, suscetíveis a condenações por desatendimento à contratação originária.

Como forma de enfrentar esse problema, a nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei Federal nº 14.133/2021) incorporou ao ordenamento jurídico nova modalidade de licitação, denominada de “Diálogo Competitivo”.

Entenda o Diálogo Competitivo

Trata-se de modalidade de licitação que contempla participação direta de licitantes na fase preparatória do certame, em situações em que Administração Pública não consegue pré-definir uma solução técnica específica. Para tanto, a Lei Federal nº 14.133/2021 prevê a necessidade de que o objeto da contratação a ser firmada por meio de Diálogo Competitivo atenda às seguintes condições cumulativas:

  • O objeto licitado se configurar como inovação tecnológica ou técnica
  • A demanda do órgão/entidade não conseguir ser satisfeita sem adaptação das soluções que já se encontrem disponíveis no mercado
  • Apresentar especificações técnicas que não possam ser definidas com precisão suficiente pela Administração

A partir da disposição sobre as necessidades e exigências já definidas pela Administração, as empresas participantes deverão auxiliar na identificação da solução técnica mais adequada, os requisitos técnicos aptos a concretizá-la e a estrutura jurídica ou financeira do contrato.

São essencialmente duas as fases que compõem essa modalidade licitatória, o diálogo entre os particulares e a Administração Pública e a fase competitiva, a seguir descritas:

1ª Etapa – Diálogo entre os particulares

Em uma primeira etapa, após divulgação em Edital sobre as necessidades e exigências da Administração, as empresas que manifestarem tempestivamente o interesse na participação da licitação e foram pré-selecionadas mediante preenchimento de requisitos objetivos estabelecidos no Edital, poderão apresentar soluções para o ente público. Todas as informações, registros e gravações de reuniões realizadas são, em regra, mantidas em sigilo até o ato decisório, quando então são anexados ao processo administrativo.

2ª Etapa – Fase competitiva

Escolhida a melhor solução, parte-se para a segunda etapa, regida por um segundo edital, a partir do qual as empresas licitantes já pré-selecionadas na etapa anterior competirão para apresentar a proposta mais vantajosa à Administração, em atendimento a critérios objetivos já estabelecidos.

Conclusão

Vê-se, logo, que com a instituição do Diálogo Competitivo a novel legislação retirou das sombras da ilegalidade a participação ativa e direta de empresas licitantes na formatação de soluções que melhor possam atender às necessidades do ente licitante, para situações previamente estabelecidas pela legislação, conferindo desejável legitimidade a essa prática.

No momento, tem-se ainda observado uma certa omissão do Poder Público em colocar em prática essa importante inovação legislativa, fato que pode estar sendo causado, em grande parte, porque em que pese a Lei Federal nº 14.133/2021 já esteja em vigor, as normas gerais de licitação dispostas na Lei nº 8.666/93 apenas serão revogadas em abril/2023.

Neste contexto, a permissibilidade em permanecer aplicando, por ora, o anterior regramento jurídico, aliada à ausência de capacitação adequada dos agentes públicos para as adaptações legislativas promovidas pela Lei Federal nº 14.133/2021 podem ser indicados como prováveis fatores que justifiquem a postergação do Poder Público para adotar essa modalidade de licitação.

Portanto, ainda teremos de aguardar um pouco para ver os desdobramentos da aplicação prática deste instituto. Até lá, é importante que as empresas busquem treinamento e orientações jurídicas adequadas sobre as nuances dessa nova modalidade licitatória, compreendendo seus alcances e limitações, como forma de se preparem para essa nova realidade, na qual passam a ser também partícipes na construção do processo licitatório.

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