Empresa pode realizar empréstimo ao empregado e descontar em holerite

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No artigo de hoje iremos esclarecer uma dúvida corriqueira de empresas clientes que seria a possibilidade (ou não) de ser emprestado algum dinheiro ao empregado para fins pessoais com posterior compensação com o salário.

Para que haja maior entendimento da situação, vamos imaginar a seguinte situação: um trabalhador solicita a empresa um valor expressivo de dinheiro para que seja possível o filho realizar um tratamento de saúde, se comprometendo a realizar o pagamento dentro de 01 ano mediante descontos mensais em sua folha de pagamento (holerite).

Nesse caso, devemos informar que a empresa pode realizar o empréstimo de valor ao trabalhador caso queira e se sinta comovida com o nobre motivo da solicitação. Contudo, esse empréstimo terá natureza civil e não trabalhista, o que gera a divergência de entendimentos sobre a possibilidade de desconto de valor em holerite.

Assim, o desconto do valor diretamente em holerite é questionável e há riscos de no futuro existir condenação a devolução dos valores descontados de forma indevida e/ou eventual necessidade de celebração de instrumento de natureza civil com cobrança por meio da justiça comum (se for o caso de não pagamento). 

 

Explica-se:

·    O art. 462 da CLT elenca as hipóteses de possibilidade de desconto de valor do salário do trabalhador, veja: 

Art. 462, CLT. Ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositivos de lei ou de contrato coletivo.

Ou seja, são três as hipóteses em que estão autorizados descontos:

o   Adiantamento salarial;

o   Autorização/Determinação legal;

o   Norma Coletiva.

Note, portanto, que não estão entre as hipóteses o empréstimo, que possui natureza civil.

Se efetuado o empréstimo, não existe previsão legal que autorize o desconto em folha de pagamento, pois o empréstimo é oriundo de relação que não integra o universo do contrato de emprego.

Alertamos, ainda, que o salário é inatingível podendo existir alguns descontos por determinações legais e convencionais.

· Diferente é caso do empréstimo consignado tomado pelo empregado em instituição financeira devidamente registrada no Banco Central do Brasil (Lei 10.820/2003), pois nesse caso há lei que regulamenta e que permite o desconto com certos limites de percentuais.

· Pretende-se demonstrar que na ausência de autorização legal para o desconto de empréstimo feito pelo empregador ao empregado, a empresa ficará exposta ao risco de ausência de pagamento pelo trabalhador e de eventual discussão da validade jurídica do desconto eventualmente realizado diretamente em holerite, ante a natureza distinta das verbas.

Veja alguns julgados sobre a natureza distintas das verbas e impossibilidade de compensação:

 

DÍVIDA DE NATUREZA CÍVEL. COMPENSAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. A compensação, na Justiça do Trabalho, está restrita a dívidas de natureza trabalhista, conforme dicção da Súmula 18 do TST. Assim, a transação realizada pelo empregador ao empregado, de nítido caráter civil, impede a realização da compensação, porquanto não se trata de parcela de natureza trabalhista.(TRT-3 – RO: 00108088420195030165 MG 0010808-84.2019.5.03.0165, Relator: Vicente de Paula M.Junior, Data de Julgamento: 26/10/2020, Decima Primeira Turma, Data de Publicação: 27/10/2020.) 

 

COMPENSAÇÃO. EVENTUAIS DÉBITOS DO TRABALHADOR DE NATUREZA CÍVEL. PARCELAS DE NATUREZA DIVERSA DA DÍVIDA TRABALHISTA. IMPOSSIBILIDADE. A compensação, na Justiça do Trabalho, está restrita a dívidas de natureza trabalhista, nos termos da Súmula 18 do TST, o que torna indevida a pretensão de que seja compensada eventual dívida cível do exequente com o crédito trabalhista objeto da presente execução. Ademais, tal dedução implicaria em abatimento de verbas sem equivalência entres os títulos, em contrariedade à OJ EX SE 1, item I, deste E. Tribunal Regional. Agravo de petição conhecido e desprovido.(TRT-9 – AP: 00018672920155090001, Relator: RICARDO BRUEL DA SILVEIRA, Data de Julgamento: 02/08/2022, Seção Especializada, Data de Publicação: 09/08/2022)

 

DESCONTO SALARIAL – DÍVIDA DE NATUREZA CIVIL – IMPOSSIBILIDADE – Tendo a reclamante adquirido empréstimo pessoal diretamente com seu empregador, a dívida assumida, por seu caráter civil, não pode ser deduzida de seus créditos trabalhistas, mesmo que rescisórios, estando os descontos salariais, ainda, limitados às hipóteses do art. 462 da CLT e do Enunciado nº 342 do TST. (TRT-12ª R. – RO-V 04417-2003-030-12-00-9 – (00450/2005) – Florianópolis – 3ª T. – Rel. Juiz Gerson Paulo Taboada Conrado – J. 07.12.2004)

  

Uma possível solução para os casos de solicitação de um volume menos expressivo de dinheiro seria a solicitação escrita, pelo trabalhador, de um adiantamento de salário, mas nesse caso a empresa deveria se atentar ao valor de antecipação e ao limite máximo de desconto mensal permitido, evitando que haja ausência de pagamento e/ou impossibilidade de desconto.

Assim, é importante que os clientes tenham ciência da divergência de entendimentos existentes acerca da possibilidade de desconto de valor de empréstimo do salário do trabalhador, evitando prejuízos e surpresas indesejadas no futuro.

São estas as principais considerações sobre o tema, sendo que eventual dúvida complementar sobre a viabilidade de realização de certo empréstimo ao trabalhador, deve ser encaminhada ao e-mail.

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